Com R$ 13 bilhões em 2024, saúde do DF segue sobrecarregada por pacientes da RIDE e de outros estados

DF: Hospital de Base é a primeira unidade 100% SUS a realizar intervenção cardíaca minimamente invasiva
Fotos: Alberto Ruy/ IgesDF

Por Gilmar Magal e Ivan Rocha 

A Secretaria de Saúde do Distrito Federal [SES-DF] fechou 2024 com um gasto recorde: R$ 13,44 bilhões investidos na rede pública, segundo levantamento do especialista em orçamento Gilmar Magal.

Mesmo com o maior orçamento da história da pasta, a sobrecarga nos serviços permanece evidente, especialmente devido à crescente demanda vinda da Região Integrada de Desenvolvimento do Distrito Federal e Entorno [RIDE-DF], e também de outros estados brasileiros que recorrem à estrutura hospitalar da capital.

Fonte de recurso 2019 2020 2021 2022 2023 2024
FCDF (recursos da União) R$ 3,87 bi R$ 4,15 bi R$ 4,28 bi R$ 3,11 bi R$ 7,56 bi R$ 7,29 bi
GDF (recursos próprios) R$ 3,75 bi R$ 4,33 bi R$ 5,31 bi R$ 6,08 bi R$ 5,03 bi R$ 6,15 bi
Total Geral R$ 7,61 bi R$ 8,47 bi R$ 9,58 bi R$ 9,19 bi R$ 12,60 bi R$ 13,44 bi

Do total executado até 2024, R$ 7,29 bilhões têm origem no Fundo Constitucional do DF [FCDF], recurso federal repassado pela União. Outros R$ 6,15 bilhões saíram diretamente dos cofres do Governo do Distrito Federal [GDF], o que representa um aumento de mais de R$ 1 bilhão em relação a 2023, quando os recursos locais somaram R$ 5,03 bilhões. Desde 2019, o orçamento da saúde praticamente dobrou — um reflexo direto da crescente complexidade na prestação de serviços e da ausência de pactuações mais eficazes com estados vizinhos.

DF continua arcando com responsabilidade tripla

Na prática, o DF continua financiando um sistema de saúde que ultrapassa suas fronteiras. Apenas entre janeiro e setembro deste ano, 36,3 mil internações hospitalares de alta complexidade e UTI foram destinadas a moradores da RIDE-DF, o que representa 48,5% do total. Além disso, 5,1 mil pacientes de fora da região — de estados como Bahia, Piauí, Maranhão e São Paulo — também foram internados no sistema brasiliense, inclusive em leitos de UTI.

O cenário se repete em outros atendimentos especializados. Foram 78,4 mil procedimentos ambulatoriais de alta complexidade realizados para pacientes da RIDE até setembro de 2024. A capital também realizou 46,7% dos tratamentos oncológicos, 72,2% dos cateterismos cardíacos e 40,3% dos exames de imagem [ressonância magnética e tomografia] desses municípios.

Alta produção, mas sistema sob pressão

O aumento no orçamento permitiu avanços na oferta de serviços, com mais de 4 milhões de atendimentos registrados na Atenção Primária à Saúde [APS] — um crescimento de 18% em relação a 2023. Ainda assim, os dados mostram que o DF continua operando sob pressão. Cirurgias ambulatoriais, por exemplo, cresceram 6,2%, com média de quase 5 mil por mês. Já os leitos de UTI consumiram quase 13 mil diárias mensais, um salto comparado às 11 mil de 2023.

Na oncologia, 246 das 1,6 mil internações para cirurgia oncológica foram destinadas a pacientes de outras unidades federativas. Na saúde materno-infantil, 71% dos partos e puerpérios da RIDE-DF foram absorvidos pela rede pública brasiliense. Dos cerca de 24 mil nascimentos registrados no DF entre janeiro e setembro, 30% são de mães que retornam com os filhos a outros estados.

E quem paga a conta?

Apesar de avanços na estrutura, como o aumento de 319 para 433 leitos de UTI desde 2018, os dados apontam uma realidade crítica: o DF continua financiando um sistema regional sem contrapartidas à altura. A ausência de um pacto federativo eficaz transfere ao contribuinte brasiliense a responsabilidade por um atendimento que deveria ser compartilhado.

A sobrecarga é evidente. Enquanto a União contribui com valores estáveis — o FCDF variou pouco entre 2023 e 2024 —, cabe ao GDF cobrir a diferença. A falta de mecanismos eficazes de ressarcimento por parte de estados vizinhos e o crescimento desordenado da população do entorno tornam o modelo atual insustentável a médio prazo.

A população brasiliense continua pagando a conta de um sistema de saúde que atende bem além do seu território, mas cujos recursos não acompanham essa expansão. Enquanto isso, a pressão sobre os profissionais de saúde e os serviços públicos só aumenta.