“Quero que entedam minha decisão. Peço que não façam minha ressucitação caso tenha uma nova parada-cardíaca.”
Essas palavras, escritas de próprio punho por H.A.S., 49 anos, internado no Hospital Brasília – Unidade Águas Claras, escancararam uma ferida que a sociedade brasileira tenta esconder: até onde vai o direito de morrer em paz?
Sem diagnóstico definitivo, mas diante de uma condição clínica grave, o paciente optou por assumir o protagonismo do próprio destino. Pediu, por escrito, que não fosse reanimado em caso de uma nova parada cardiorrespiratória.
Mas… será que essa decisão cabe apenas a ele?
Até que ponto respeitar tal pedido é ético, humano e legal?
Ou será que estaríamos falando, na prática, de uma forma velada de eutanásia — prática proibida no Brasil?
O que leva um homem de apenas 49 anos, teoricamente em idade produtiva, a desistir da possibilidade de continuar vivendo?
É o cansaço? O medo da dor? A frustração com a medicina moderna que promete tudo, mas nem sempre entrega dignidade?
Ou seria uma mensagem silenciosa, mas poderosa, de alguém que não quer ser mantido vivo a qualquer custo, preso a tubos, máquinas e protocolos que estendem o sofrimento em nome de uma vida biológica vazia de sentido?
Quantos pacientes no Brasil se sentem assim, mas não têm coragem — ou voz — para formalizar essa decisão?
Estamos preparados, enquanto sociedade, enquanto profissionais de saúde, enquanto famílias, para respeitar o direito de morrer?
Ou ainda insistimos em lutar contra a morte, mesmo quando ela parece ser a libertação mais digna?
Pedidos como o de H.A.S nos obrigam a encarar nossas próprias contradições.
Afinal, de quem é a vida?
Quem decide quando é hora de parar?
E, sobretudo, até quando vamos tratar o tema como tabu, ignorando o sofrimento de quem, em silêncio, só pede: deixem-me partir em paz?