Qual o código-fonte do sistema informatizado do STF que realiza a distribuição de processos? Foto e edição: Ivan Rodrigues

Como é decidido qual ministro do STF vai relatar qual processo? Em alguns casos, a sociedade tem se perguntado se “não será muita coincidência que o processo x tenha caído com o ministro y?” Para notar a importância da questão, basta lembrar a apreensão de todo o país com o sorteio do novo relator da Lava-Jato após o falecimento do Ministro Teori Zavascki.

A distribuição dos processos no STF ou em qualquer tribunal tem que seguir o mesmo pressuposto básico: o juiz não escolhe que casos vai julgar e as pessoas não decidem que juízes julgarão seus casos. Mas como isso funciona?

Confira o texto do site Politize! explicando esse processo:

AS REGRAS DE DISTRIBUIÇÃO DE PROCESSOS NO STF

No que diz respeito ao STF, as regras estão no Regimento Interno do STF (RISTF) e o pouco que sabemos sobre como isso funciona na prática está em informações apuradas por jornais.

No capítulo III do RISTF, estão sistematizadas as regras do regimento sobre a distribuição de processos. O regimento define que:

“A distribuição será feita por sorteio ou prevenção, mediante sistema informatizado, acionado automaticamente, em cada classe de processo.”

Mas o que é classe de processo? Por hora, o leitor deve saber que quando acionamos o judiciário, é para pedir algo (a liberdade de alguém, uma indenização ou a guarda de uma criança). A classe processual deve ser adequada ao pedido que se quer fazer. Por exemplo, se quero pedir que alguém preso seja posto em liberdade, a classe processual é o habeas corpus. Todas as classes são distribuídas segundo as regras que falaremos em seguida. Feito esse parênteses, vamos voltar para a distribuição dos processos.

PREVENÇÃO, SORTEIO E OUTRAS REGRAS

O RISTF diz que a distribuição será feita por sorteio ou prevenção.

Mas o que é distribuição por prevenção?

Prevenção ocorre quando um processo já tem um responsável fixo decidido em sorteio anterior, não sendo necessário outro sorteio. Seria pouco eficiente que recursos que digam respeito à Operação Lava-Jato fossem distribuídos a um novo juiz, que não está familiarizado com a questão. Assim, esses casos serão diretamente endereçados ao relator da matéria. Se a hipótese não é de prevenção, recorre-se ao sorteio.

E como se dá o sorteio? O Regimento define que:

“O sistema informatizado de distribuição automática e aleatória de processos é público, e seus dados são acessíveis aos interessados.”

Ou seja, o sorteio é feito por um sistema informatizado, público e acessível, que distribui os processos de maneira automática e aleatória. Antes de falarmos desse sistema, é preciso falar de outra questão: seriam essas as únicas regras? Não, a prevenção e o sorteio são as principais regras da distribuição.

No entanto, o RISTF discorre também sobre inúmeras outras regras. Algumas delas são:

  • O processo não pode ser distribuído ao Presidente do STF para não o sobrecarregar, nem ao vice-presidente quando este estiver ocupando o cargo;
  • O processo não pode ser distribuído a cargo vago, ministro licenciado ou em missão oficial por mais de 30 dias;
  • Caso o ministro seja declarado suspeito ou impedido, novo sorteio será realizado;
  • O ministro que estiver ocupando a vaga de Presidente do TSE será excluído da distribuição de processos com pedido de liminar – mesmo em caso de prevenção – já que liminares precisam ser decididas rapidamente;
  • Se o processo envolver ato cometido por ministro, ele será excluído da distribuição;
  • Se um inquérito policial – ação que visa investigar e averiguar os fatos – for distribuído a um ministro, a ação penal resultante desse inquérito deverá ser distribuída ao mesmo ministro. Por exemplo, Joaquim Barbosa foi relator do Inquérito 2245, que averiguou os fatos do “mensalão”, e posteriormente da Ação Penal 470, que apurou os responsabilidade dos envolvidos;
  • E outras regras no RISTF, entre os artigos 66 e 77-D.

Segundo o RISTF, quando um processo precisa ser distribuído a um ministro devido à regra da prevenção, ou não pode ser distribuído a um ministro em missão oficial, essas distribuições são compensadas posteriormente. Isso ocorre para evitar uma distribuição desigual entre os ministros. No entanto, o RISTF não é claro sobre como essas compensações são feitas.

Agora que falamos da prevenção, do sorteio e de outras regras, vamos explicar o sistema informatizado.

SISTEMA INFORMATIZADO

O RISTF diz que um sistema informatizado distribuirá os processos automaticamente e aleatoriamente. Mas como esse sistema sabe que o ministro “x” está ausente? Como o sistema sabe que, por prevenção, dado processo deve ser distribuído ao ministro “y”? Há muita dúvida em torno do funcionamento desse sistema.

Recentemente, a Resolução n.558 de 2015 ajudou a esclarecer alguns pontos. Segundo a Resolução, a distribuição somente será realizada por servidor ocupante de cargo efetivo ou de confiança, não podendo ser feita por funcionário terceirizado ou por estagiário. Ou seja, o sistema informatizado que fará a distribuição é alimentado por um funcionário público.

Mas que informações esse funcionário deve fornecer ao sistema informatizado? Deverá informar o número do processo, os ministros excluídos da distribuição e em que dispositivo normativo se baseou para tomar essa decisão.

Por exemplo, o Art. 73 do RISTF diz que o relator de uma arguição de suspeição a ministro – ou seja, quando alguém alega que o juiz é suspeito para julgar uma questão em virtude de seu vínculo com uma das partes – deverá ser relatada pelo Presidente do Tribunal. Por exemplo, quando Rodrigo Janot ainda estava na Procuradoria Geral da República, ele arguiu a suspeição de Gilmar Mendes para julgar os casos envolvendo Jacob Barata tendo em vista o contato do ministro com a família do empresário. A relatoria da questão ficou com Cármen Lúcia, por ela ser a Presidente.

Assim, o funcionário deveria excluir todos os ministros da distribuição, exceto o presidente, e deveria justificar a exclusão com base no Art. 73. Ao fim do processo de distribuição, a justificativa inserida no sistema deverá constar no processo informatizado. Posteriormente, deverá ser validada formalmente pelo Coordenador de Processamento Inicial ou pelo Secretário Judicial.

Esse é o modo como acredita-se que a distribuição é feita quando analisamos a Resolução e o RISTF. No entanto, não se sabe muito sobre como a distribuição ocorre de fato, exceto pelos fatos apurados pelos jornais.

Segundo a Folha, por exemplo, os ministros geralmente não acompanham o sorteio, que costuma ser realizado em um anexo no segundo andar do STF. O jornal também esclarece o funcionamento do software, o que não pode ser encontrado no RISTF.

Segundo o jornal, o sorteio funcionaria como uma régua que vai do número 1 ao 100. O STF tem 11 ministros, exclui-se o presidente, e cada um dos demais tem um espaço igual da régua, ou seja, 10 números. Por exemplo, se cair entre os números 1 e 10, o processo vai para o ministro A, se cair entre os números 11 e 20, o processo vai para o ministro B, e assim por diante.

No entanto, a depender das regras vistas, por exemplo, ministros ausentes e impedidos, o espaço dos demais ministros na régua aumenta, assim como a probabilidade de serem escolhidos para relatar um determinado processo. Novamente, não fica evidente como a posterior compensação seria feita e muitas perguntas precisam ser respondidas.

Recentemente, em virtude das controvérsias em torno da distribuição de processos, um cidadão entrou com um pedido de acesso à informação – com base na Lei de Acesso à Informação (LAI) – requerendo o código-fonte do sistema informatizado que realiza a distribuição. A resposta para esse pedido foi negativa. O STF alegou que a distribuição “é feita através de um sistema informatizado desenvolvido pela equipe de Tecnologia da Informação da Corte, o qual utiliza um algoritmo que realiza o sorteio do relator de forma aleatória” e argumentou ausência de previsão em lei obrigando o STF a divulgar tais informações.

Isso levou dois pesquisadores da FGV Direito Rio a questionarem se essa postura por parte do STF era legal. Os pesquisadores basearam seu argumento no fato de que “a transparência de dados, dentro ou fora do Judiciário, é pressuposto geral da administração pública”. Desse modo, mesmo que não haja uma lei específica obrigando o STF a fornecer a informação, pela Lei de Acesso à Informação, o Supremo estaria obrigado a permitir o acesso ao código-fonte. Os pesquisadores também argumentam que códigos-fonte que protegem informações muito mais delicadas – como os que guardam bitcoins – são públicos. Não haveria, portanto, motivo para o sigilo em torno dos códigos responsáveis pela distribuição dos processos no STF. Trata-se de um debate extenso.

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Foto e edição: Ivan Rodrigues

                   Ivan Rodrigues é enfermeiro e blogueiro