Se Lula fosse um cidadão comum à espera do SUS, poderia já estar sequelado ou morto ✞

Se Lula fosse um cidadão comum à espera do SUS, poderia já estar sequelado ou morto
© Paulo Pinto/Agência Brasil

Artigo de opinião

Ivan Rocha @ivanrocha

Na madrugada da última terça-feira (10), o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, de 79 anos, foi submetido a uma cirurgia de emergência no renomado Hospital Sírio-Libanês, em São Paulo, para drenar um hematoma na cabeça decorrente de uma queda sofrida em outubro.

Um segundo procedimento foi realizado nesta quinta-feira (12) para prevenir novos sangramentos.

“O procedimento acabou de acabar, foi com sucesso, a gente conseguiu embolizar aquela artéria. […] O presidente está acordado e conversando”, afirmou o médico Roberto Kalil, após o procedimento, que teve início por volta das 7h15 e durou menos de uma hora.

Apesar da gravidade da situação, o chefe do Executivo recebeu atendimento imediato e especializado, um privilégio distante da realidade da maioria dos brasileiros que dependem do Sistema Único de Saúde (SUS).

Ainda em Brasília, um exame de imagem revelou uma hemorragia intracraniana de cerca de três centímetros, o que levou à transferência urgente do presidente para o Sírio-Libanês. A equipe médica, composta pelos melhores especialistas do país, garantiu a realização rápida da trepanação, procedimento delicado que exige infraestrutura e tecnologia de ponta. O resultado: nenhuma sequela, nenhum dano neurológico, e um prognóstico promissor.

Mas o que teria acontecido se Lula fosse um cidadão comum?

No SUS, onde a demanda por procedimentos neurocirúrgicos supera em muito a capacidade de atendimento, o cenário seria drasticamente diferente. Pacientes com hemorragias intracranianas frequentemente enfrentam filas de espera para exames e cirurgias, mesmo em casos de emergência. Muitos não resistem. Outros sobrevivem, mas com sequelas permanentes devido ao atraso no atendimento.

Em 2022, o Conselho Federal de Medicina (CFM) divulgou dados alarmantes: o Brasil tem apenas 7,5 neurocirurgiões por 100 mil habitantes, distribuídos de forma desigual. Enquanto cidades como São Paulo concentram especialistas, regiões do interior e do Norte do país enfrentam escassez crítica. Além disso, hospitais do SUS carecem de equipamentos modernos e insumos básicos, o que compromete a qualidade do atendimento.

É nesse abismo entre o público e o privado que se revela o contraste. Enquanto o presidente tem acesso à melhor medicina disponível no país, financiada pelos cofres públicos, milhares de brasileiros sofrem nas filas do SUS. A desigualdade no acesso à saúde é mais do que uma questão de infraestrutura: é uma questão de vida ou morte.

A ironia é que o SUS, concebido como um sistema universal e igualitário, é um dos grandes legados das gestões petistas. No entanto, o subfinanciamento crônico e a falta de políticas efetivas de fortalecimento comprometem sua função. Para os brasileiros que dependem do SUS, a experiência é de abandono, enquanto para a elite política, a excelência da medicina privada está sempre ao alcance.

A situação de Lula é mais uma demonstração da desigualdade estrutural que assola o país. Quantos brasileiros em condições semelhantes já não morreram ou ficaram sequelados pela demora em conseguir atendimento? Quantos mais precisarão enfrentar essa realidade antes que algo seja feito para reverter esse cenário?

O debate sobre o acesso igualitário à saúde precisa ser urgente e incisivo. A sobrevivência do presidente, garantida por um sistema de saúde paralelo e exclusivo, é um lembrete amargo de que, no Brasil, o direito à vida está longe de ser universal.