Mulher de Santo André alegava não ter condições de arcar sozinha com os gastos da cachorra adquirida durante o casamento; tribunal rejeitou pedido
A Justiça de São Paulo negou, nesta semana, o pedido de uma moradora de Santo André, no ABC Paulista, para que o ex-marido fosse condenado a pagar pensão alimentícia referente à cachorra do ex-casal. A decisão reacende o debate jurídico e social sobre os limites da proteção legal aos animais de estimação no Brasil, especialmente em casos de dissolução conjugal.
A autora da ação alegou que a cadela da raça boxer, adquirida durante o casamento de seis anos, ficou sob sua responsabilidade exclusiva após o divórcio, e que os custos mensais para mantê-la em condições adequadas superam R$ 900. Entre os itens listados, estavam ração, higiene, suplementação, vacinas e roupas de inverno. A mulher também apresentou comprovantes de despesas veterinárias que, em um episódio de doença, ultrapassaram R$ 3 mil.
Ao justificar o pedido, a defesa da mulher destacou o caráter sensível dos animais e argumentou que, apesar de a legislação brasileira ainda tratá-los como bens ou coisas, a ciência e a sociedade já reconhecem os pets como seres sencientes, ou seja, capazes de sentir dor, afeto e sofrimento. Com base nisso, sustentou que o bem-estar do animal deveria ser considerado como responsabilidade conjunta do ex-casal, sobretudo porque a adoção do pet foi uma decisão mútua.
A relatora do caso no Tribunal de Justiça de São Paulo, juíza Fátima Cristina Ruppert, discordou da tese. Em sua decisão, ela reconheceu o valor afetivo dos animais nas relações humanas, mas ressaltou que “não é possível atribuir a eles o status de sujeitos de direito”, o que impede qualquer analogia com o regime jurídico de alimentos previsto no Direito de Família.
“Não há possibilidade de aplicação analógica ao caso das disposições referentes à pensão alimentícia decorrente da filiação”, afirmou a magistrada. Segundo a decisão, a obrigação de arcar com os custos da cadela recai exclusivamente sobre quem detém sua guarda e posse – no caso, a ex-esposa.
Um debate em evolução
A sentença não encerra o debate sobre como o ordenamento jurídico deve lidar com os vínculos afetivos e as obrigações materiais relacionadas a animais de estimação em disputas familiares. Nos últimos anos, decisões judiciais em diversas instâncias passaram a considerar aspectos emocionais e de bem-estar dos pets em ações de guarda, por exemplo.
Ainda que a jurisprudência brasileira avance lentamente, especialistas em direito de família e direito animal apontam para a necessidade de uma atualização legislativa que contemple a condição especial dos animais domésticos, hoje tratados por muitas famílias como membros do núcleo familiar.
Enquanto isso, casos como o da moradora de Santo André expõem os limites da atual legislação, onde, apesar do carinho, da convivência e da responsabilidade afetiva compartilhada, a manutenção do animal continua sendo tratada como uma obrigação unilateral de quem ficou com ele após o fim da relação.




