Em pouco mais de seis anos,de julho de 2016 a novembro de 2022, 1.000 pessoas foram vítimas de balas perdidas na Região Metropolitana do Rio de Janeiro, é o que mostra o levantamento inédito produzido pelo Instituto Fogo Cruzado

Epidemia das Balas perdidas no Rio
Epidemia das Balas perdidas no Rio

Entre as vítimas, 229 morreram e 771 ficaram feridas. Somente em 2022 foram 20 mortos e 62 feridos até o marco das 1.000 vítimas. O pior ano da série histórica foi em 2018, quando 252 pessoas foram vítimas de balas perdidas: 47 mortas e 205 feridas. Naquele ano, a Região Metropolitana do Rio vivia o período de Intervenção Federal, que durou 10 meses.

Maria Isabel Couto, diretora de Dados e Transparência do Instituto Fogo Cruzado, destaca o elevado número de vítimas nas ações policiais. Dos 1.000 baleados, 624 foram atingidos na presença policial. 162 deles não resistiram e morreram. “As ações e operações obedecem a uma lógica de conflito. As polícias não estão preparadas para evitar conflitos e isso se reflete no número elevado de vítimas de balas perdidas. Foram nove meses sem um plano de redução da letalidade policial desde que o STF determinou a elaboração de um projeto que visasse a redução de mortes pelos agentes do Estado. Esse é um passo importante para que a população do Rio de Janeiro deixe de viver à mercê de tiroteios que trazem traumas e afetam a rotina”, avalia.

Na cidade do Rio de Janeiro, 80% dos moradores dizem ter medo de serem vítimas de balas perdidas e 59% declararam que se mudariam da cidade caso fosse possível, revelou pesquisa do Datafolha divulgada em 2022. Na região metropolitana a violência está em todos os lugares e faz com que nem o próprio lar seja um lugar seguro. 108 pessoas foram vítimas de balas perdidas quando estavam dentro de casa (33 morreram e 75 ficaram feridas). Outras 25 pessoas foram atingidas quando se divertiam em bares (cinco mortos e 20 feridos). Transitar pela região metropolitana também fez com que 18 pessoas fossem baleadas dentro de transportes públicos (uma morta e 17 feridas). 

Os adultos, que transitam diariamente pelas cidades são os mais afetados e representam 688 baleados entre as 1.000 vítimas: 137 foram mortos e 551 ficaram feridos. A população idosa, com idade a partir de 60 anos, representou 119 das vítimas de balas perdidas: 77 morreram.

A violência armada prejudica crianças, adolescentes e profissionais do ensino de muitas formas. As aulas precisam ser canceladas, o ano letivo é prejudicado e corredores de escolas são ocupados por jovens e professores que precisam se proteger mas que nem assim conseguem. Em pouco mais de seis anos, 16 pessoas foram vítimas de balas perdidas dentro de unidades de ensino: uma morreu e 15 ficaram feridas.

Entre a população com idade inferior a 18 anos, 87 crianças e 92 adolescentes sofreram com as balas perdidas. Desse número, 21 crianças e 27 adolescentes não resistiram aos tiros e morreram. Houve ainda quem nem chegasse a conhecer o mundo: três bebês foram baleados quando ainda estavam na barriga da mãe: somente um sobreviveu. E 10 gestantes foram atingidas por balas perdidas: duas morreram e oito ficaram feridas.

Maria Isabel Couto lembra ainda das consequências invisíveis dos tiroteios. “Crianças e adolescentes em idade escolar têm o seu futuro prejudicado. As aulas são canceladas, provas são perdidas e professores e diretores precisam se preocupar com a própria segurança e a segurança de seus alunos. Incerteza, trauma e medo de serem as próximas vítimas da violência armada são efeitos diretos dos tiros que comprometem a aprendizagem. Os tiros deixam marcas, que vão além do está na pele e geram consequências que podem durar anos”.

Os trabalhadores informais também convivem diariamente com os riscos. Ao todo, nove motoboys/mototaxistas foram vítimas de balas perdidas (três morreram e seis ficaram feridos), oito motoristas de aplicativo foram baleados (metade morreu) e outros nove vendedores ambulantes também foram atingidos (um morreu e oito ficaram feridos).

SOBRE O FOGO CRUZADO

O Fogo Cruzado é um Instituto que usa tecnologia para produzir e divulgar dados abertos e colaborativos sobre violência armada, fortalecendo a democracia através da transformação social e da preservação da vida. 

Com uma metodologia própria e inovadora, o laboratório de dados da instituição produz mais de 20 indicadores inéditos sobre violência nas regiões metropolitanas do Rio, do Recife e de Salvador.

Através de um aplicativo de celular, o Fogo Cruzado recebe e disponibiliza informações sobre tiroteios, checadas em tempo real, que estão no único banco de dados aberto sobre violência armada da América Latina, que pode ser acessado gratuitamente pela API do Instituto.